“Ei, Globo! Sou nêga, mas não das suas!” Frases de alerta como esta estão aparecendo através de postagens em redes sociais por mulheres negras contra a série que estreou na semana passada na Rede Globo. Escrita pelo autor e ator Miguel Falabella, Sexo e as Negas está sendo acusada de racismo por seu título.
Na coletiva de imprensa de lançamento do seriado, o autor tentou se explicar sobre a polêmica que já surgia antes mesmo do programa começar:
“ Eu já vi as críticas na internet. Só no Brasil as pessoas falam do programa antes de assistir. Eu escolhi esse nome como uma prosódia do jeito carioca de falar, inclusive por isso não tem o ‘r’ em negras. Por esse motivo também tinha que ser eu mesmo falando o nome no final da vinheta. As pessoas precisam encarar com humor. Mas é isso, as pessoas têm que protestar mesmo. Este país precisa de protestos!”
Falabella pediu e foi exatamente o que vem acontecendo agora com mais veemência do que antes. Protestos! Com todo esse debate acontecendo a Agência Experimental de Notícias (AEN-Unime) buscou na opinião de mulheres e homens com diferentes estilos culturais o que representava para eles a série Sexo e as Negas. A proposta foi que essas pessoas assistissem o primeiro capítulo do programa e, juntamente com toda mobilização que já estava acontecendo nas mídias sociais, pudessem colaborar dando o seu ponto de vista sobre a questão.
Aline Lepingard, 32 anos, estudante de jornalismo, conta sua experiência em assistir à série:
“Antes mesmo de começar a nova série da Globo Sexo e as Negas já tinha me chamado atenção por causa do título. Achei que utilizar a palavra “nega” por si só já trazia o preconceito que poderia conter na série; então resolvi pesquisar. Logo no início descobrir que o autor Miguel Falabella teve a brilhante ideia de fazer o programa baseado na série norte-americana Sex and the City, com a diferença que a versão brasileira seria com quatros mulheres negras, moradoras de periferia e com empregos comum. Ao contrário da versão norte-americana, onde as mulheres são brancas e bem sucedidas. Mas como nada pode ser julgado sem ser visto, assisti o primeiro capítulo da série e logo de cara fiquei chocada, pois nunca pensei que todos os estereótipos que podem ser ligados à mulher negra estivessem juntos em um só programa, ou melhor, somente no primeiro capítulo. Temos quatro mulheres onde todas são bonitas, que trabalham, mas nenhuma com a perspectiva de melhorar de vida, e além disso nenhuma delas tem uma família e se mostram desesperada por arranjar um homem. Resumindo, essa série veio para reforçar mais uma vez que as mulheres negras são vistas como objetos sexuais e não dignas de respeito.”
Já Milena Moura, 27 anos, assistente social, que acompanha à discussão pelo Facebook, tem uma opinião diferente:
“Um país que foi o último no mundo a abolir a escravidão, que toda sua base econômica foi construída por mão de obra escrava, em que os negros foram "libertos" e soltos nas favelas; não seria intrinsecamente um país racista? Acredito que sim. Talvez o que não estamos habituados é ver nossa ferida exposta, é nos deparar com quem somos e como somos. Questiono-me se fosse 'sexo e as brancas' nos incomodaria tanto? O que nos incomoda tanto é ver as bases que construímos a nossa sociedade”.
Em concordância com esta visão, Clodoaldo Silva, 28 anos, corretor, expressa que não tem problemas em chamá-lo de negro:
“Sou negro, e daí? Ficaria ofendido se me chamassem de mau caráter. A série só mostra a realidade das mulheres das comunidades, que enfrentam à vida de frente. Conseguindo conciliar filho, família e casos amorosos. Em relação às cenas de sexo, pior já vimos na Rede Globo. Hoje, é uma série com contexto atualizado, em um modo que tudo é muito explícito. Gostei do modo que as mulheres tomam direção de suas vidas. Todos os personagens passam uma imagem da vida real, muito convincente, sem dúvidas a série será um sucesso e acho que ainda virá muita polêmica.”
Lílian Lopes, 32 anos, estudante de jornalismo, questiona o autor da série Miguel Falabella:
“Eu lhe pergunto Falabella, por que todas as vezes que os negros são representados nas mídias os estereótipos são os mesmos? As negras sempre são cozinheiras, domésticas, babás? Será que isso nunca mudou? Será que os negros ainda são escravos? Claro que mudou. Nós galgamos, digo nós, porque me incluo, afinal a única diferença que tenho por outra pessoa de pele mais escura é justamente a pigmentação, ou seja, a melanina, pois a raça é uma só e essa é chamada: raça humana. Então voltando digo: galgamos sim lugares e papéis na sociedade e isso precisa ser exposto.”
A professora de jornalismo e também doutoranda em Literatura e Cultura pela UFBA, Kátia Borges, acha que a série Sexo e as Negas “repete clichês, reforça estereótipos, que não avança, não contribui com o debate sobre racismo”. Na avaliação de Juliana Gimenez, 28 anos, psicóloga, a série de Miguel Falabella é “sexista e racista, pois reforça o preconceito em relação à mulher negra e sua sexualidade. Estereótipo que muitos homens e mulheres negras lutam há séculos na tentativa de desmistificar”.
Um grupo feminista do coletivo Blogueiras Negras criou na internet a série As Nega Real. Composta por Aline Djokic, Charô Nunes, Gabi Porfírio e a convidada Djamila Ribeiro, tem como objetivo discutir as questões propostas pela série de Miguel Falabella. Charô Nunes, arquiteta, apontou no jornal Zero Hora cinco erros na estrutura da série para quem quer compreender a polêmica:
“A premissa transforma nossa existência em objeto de estudo e manipulação midiática, constituindo um estupro simbólico. Reduz nosso lugar social, enfatizando que nosso objetivo é apenas encontrar um parceiro sexual. Também tem se mostrado, até o momento, cisheteronormativa, além de reforçar o estereótipo de que todas somos trabalhadoras domésticas. E, finalmente, o título, que tem ligação direta com a expressão racista e machista "não sou tuas nêga", definindo o valor e o tratamento que a mulher negra receberá em relação a uma mulher branca. Desumaniza a negra, e o nome disso é racismo.
Agora, o que será preciso é observar o desenvolvimento do programa para saber se de fato retratará a situação das negras na sociedade brasileira atual.
Dilson Ventura
Gostei muito da forma que o Dilson montou a sua matéria, consigo perceber que utilizou a teoria crítica, onde permite que determinado assunto seja analisado profundamente e não superficial, ou seja, o texto foi montado com vários ângulos, isso de certa forma nos ajuda a construir a nossa opinião ou até mesmo alterá-la. Pois muitas vezes chegamos a conclusões porque só temos um ângulo daquele assunto e isso é o que mais estamos vivenciando nos últimos tempos... Uma verdadeira Indústria Cultural - pessoas alienadas comprando sempre a ideia que as mídias de massa nos impõe sem nem mesmo nos questionarmos. Como diz:“Ei, Globo! Sou nêga, mas não das suas!” Vamos montar o nosso também: "Ei Indústria Cultural! Sou de certa forma um produto, mas não dos seus! Sou um produto pensante! ESTUDANTE DE JORNALISMO
ResponderExcluirMUITO BOA!
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