Subúrbio Ferroviário, além do que é mostrado

Moradores buscam mostrar pela arte que o local é mais do que os estereótipos


Centro de belezas naturais e uma cultura diversa, o morador do subúrbio ferroviário de Salvador tem muito orgulho de residir na região. A violência, que tanto é difundida pela mídia, não corresponde à realidade vivida por cerca de 600 mil habitantes em 22 bairros. Moradores como Perinho Santana, Camila Souza e Anderson Simplício, por exemplo, trabalham diariamente mostrando através dos seus projetos sociais como vivenciam a região.

Além do grande número de habitantes, no subúrbio são encontrados diversos pontos considerados de grande importância para a história da cidade. Esse é o caso da Igreja Nossa Senhora de Escada (Escada), que poucos anos após a sua fundação recebeu a visita do Pe.José de Anchieta para se recuperar de uma enfermidade. Por lá também encontra-se o Parque São Bartolomeu, que foi habitado por tupinambás. No século 17, essa reserva de Mata Atlântica foi palco das lutas contra a invasão holandesa, e no século 19 foi local onde as lutas pela independência da Bahia foram travadas.

Por sua beleza e tranqüilidade, a orla da suburbana era considerada área de veraneio para pessoas abastadas e foram construídos casarões que podem ser vistos ainda hoje em localidades como São Tomé e Plataforma. O bairro de Plataforma também foi um pólo industrial importante, com a usina do fazendeiro Almeida Brandão que, nove anos mais tarde, seria transformada na Fábrica São Braz. Juntamente à fábrica União Fabril dos Fiais contribuíram bastante para o povoamento da comunidade e as ruínas das duas ainda podem ser vistas.

Perinho Santana     Foto: Acervo pessoal
Ao caminhar por ruas dos bairros são encontradas diversas poesias pintadas em muros e escadarias, isso é literalmente arte do poeta e artista visual Perinho Santana. Ele abandonou o emprego fixo há aproximadamente oito anos e decidiu viver de poesia. Isso lhe rendeu destaque em sua comunidade e o lançamento do livro Plataforma na Poesia (2011), que é sua maior realização profissional. “Só tenho um arrependimento nessa história com a poesia. Logo que comecei a pintar os muros daqui eu criava a poesia e passava diretamente para a parede, e isso fez com que eu perdesse dezenas delas, então essas são vivas apenas na memória de quem as viu”, conta o poeta.

Para Perinho, suas poesias contribuem de forma positiva na visão do suburbano, por se sentirem representados de uma forma diferente da realidade: ”Sou nascido e criado em Plataforma, e eu sei que aqui não tínhamos muito contato com isso de poesia, de arte, cultura. Era algo tão distante, aí eu precisava uma forma de mostrar que podemos ser quem quisermos e incentivar os jovens e os mais velhos a lutarem. Fico feliz quando ouço histórias de que realmente contribuí de alguma forma para essa luta”.


Anderson Simplício     Foto: Acervo pessoal
Em uma esfera diferente, Anderson Simplício escolheu outro meio para tentar tirar os estereótipos do subúrbio. Ele era morador do bairro do Pau Miúdo e após conhecer sua namorada, que é moradora de Paripe e ir visitá-la, percebeu que tudo aquilo que pensava sobre o local não passava de um "pré-conceito", uma opinião sem base no conhecimento: “Só me falavam da violência e sujeira, até que um dia fui conhecer os pais da minha namorada e fui apresentado ao Subúrbio. Já no primeiro momento vi o mar e suas belezas. Todo aquele conceito que eu tinha mudou”.

Anderson é criador da página do Facebook Belezas do Subúrbio que em menos de dois anos após sua criação conta com mais de 75 mil seguidores e tomou proporções nacionais: “Depois de casado resolvi correr pela Suburbana, e nessas corridas eu não consegui passar por aqueles lugares sem conseguir tirar nenhuma foto. Resolvi mostrar para alguns amigos e postar em minha rede social pessoal. Com o destaque, decidi organizar todas criando a página. Daí pra frente a cada foto aumentava o número de seguidores e compartilhamentos", diz ele. Animado com o sucesso da página, Anderson decidiu estudar mais sobre fotografia, e com isso o seu trabalho tem se profissionalizado.

Camila Souza     Foto: AEN Unime
A fotografia também foi a forma encontrada por Camila Souza para mostrar o local que nasceu e foi criada. A exposição “Janelas da Favela” ficou aberta à visitação no teatro Gamboa Nova e no Centro Cultural de Plataforma, em 2016. Diferentemente de querer mostrar uma realidade para quem está fora, a intenção de Camila sempre foi fazer com que moradores acreditem na beleza do local. “Para mim, é ainda mais importante que as pessoas que moram aqui reconheçam a beleza do lugar. Se eu consigo fazer que os moradores do subúrbio valorizem o local, eu já fico satisfeita, o resto é consequência”.

Camila acredita que quando o morador do subúrbio aceita sua cultura, consegue passar isso para quem é de fora: “Mostrando primeiro para o povo suburbano e depois para as pessoas de outros lugares que somos um povo rico em arte, cultura e privilegiados pelas belas paisagens que cercam nosso território”.

Atualmente Camila será mediadora do projeto FotoTrem, que irá ensinar técnicas de fotografia experimentais (Cianotipia, Marrom Van Dyke, Papel Salgado e Goma Bicromatada) a jovens fotógrafos moradores do subúrbio e região, as oficinas serão realizadas na estação de trem da Calçada.

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